segunda-feira, 4 de março de 2013

500 Anos da Biblioteca da Universidade


A Universidade de Coimbra celebra, este ano, os 500 anos da Biblioteca da Universidade. As comemorações ficarão marcadas pela realização de um congresso internacional, por Conversas Culturais, por exposições, entre muitas outras atividades culturais.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Publicações do Projeto Instituto de Coimbra

Encontram-se disponíveis, para consulta e download, os seguintes textos, resultantes do trabalho de investigação iniciado no ano de 2008, pela bolseira de investigação Licínia Ferreira:

Monografias
Artigos em revistas
Artigos em livros de atas
Concluído o trabalho da investigadora Licínia Ferreira, compete-nos deixar-lhe uma palavra de elevado agradecimento pela sua participação ativa no desenvolvimento do Projeto Instituto de Coimbra e pelo seu contributo para o esclarecimento da história desta academia científica e literária.

domingo, 13 de novembro de 2011

O Instituto e a Sismologia em Coimbra

A existência do IC e, em particular, do respectivo periódico que reportava a actividade científica e académica na então única universidade portuguesa, terá encorajado os seus sócios a envolverem-se em novas áreas científicas. António dos Santos Viegas (1835-1814), professor catedrático de Física e sucessor de Jacinto de Sousa na direcção do Observatório Meteorológico e Magnético (OMM) da UC, que acumulou, entre 1885-86, com a presidência de IC e, entre 1890-92 e 1906-7, com a Reitoria da UC, foi um dos pioneiros da sismologia portuguesa. Em 1891, ajudou na aquisição de um primeiro sismógrafo para o OMM (um aparelho Angot B, No. 5388, construído na casa Breguet), que se manteve em funcionamento até 1914/15.



Tendo sido o OMM da UC o precursor nacional dos estudos sismográficos, Santos Viegas cuidou de não descurar a área, procurando aperfeiçoar os serviços prestados. O sismógrafo de Angot terá funcionado com alguma regularidade, o que se comprova pela aquisição de papel fotográfico para o sismógrafo e uma anotação com data de 24 de Abril de 1901 que regista um tremor de terra em Lisboa e Algarve, apesar de os resultados não terem vindo a lume em qualquer publicação. Verificou-se, na transição de século, que a sensibilidade e a velocidade de registo deste aparelho não eram suficientes para sustentar uma secção de sismologia, pelo que, em 1900, Santos Viegas promoveu a aquisição de um sismógrafo Milne, de pêndulo horizontal, ao Observatório inglês de Kew, instrumento que chegou a Portugal no ano seguinte. Embora as obras de construção de um pavilhão tenham sido logo iniciadas, a instalação do novo aparelho, que registava movimentos sísmicos da direcção este-oeste (E-W), apenas foi concluída em 1904.
Como aconteceu com outras instalações científicas nacionais dessa época, as limitações derivadas da falta de pessoal técnico para tabular com regularidade os registos impediu, nos anos seguintes, a publicação dos resultados. Apenas em 1908 se conseguiu obter os serviços de um recém-graduado na Faculdade de Filosofia da UC, Egas Fernandes Cardoso e Castro (1885-?). Este bacharel foi admitido como praticante extraordinário sendo, no ano seguinte, encarregado da nova secção de sismologia. Embora não sendo remunerado, o trabalho de Egas de Castro permitiu a publicação das observações sísmicas de 1909. Estas vieram juntar-se às observações meteorológicas e magnéticas que já tinham sido compiladas ao longo das quatro décadas anteriores, suscitando a alteração do nome da publicação anual do OMM (Observações Meteorológicas, Magnéticas e Sísmicas…, 1910). Com a criação da secção de sismologia, ficou completa a investigação na área das ciências geofísicas em Coimbra. A participação de Egas de Castro foi devidamente destacada por Santos Viegas.
Por coincidência, foi também em 1909 que ocorreu o sismo mais forte sentido na Península Ibérica no século XX. Este abalo veio relançar o debate sobre a necessidade de criar um serviço nacional de sismologia. O tremor de terra teve o seu epicentro próximo da vila de Benavente, mas os seus efeitos devastadores fizeram-se sentir numa vasta região, na margem sul do Tejo, cerca de 40 km a montante de Lisboa. Registaram-se 47 mortos e os danos patrimoniais foram consideráveis: cerca de 40% dos edifícios de Benavente ruíram, tendo de ser demolidos e só 20% sofreram danos menores. O sismógrafo de Coimbra foi o único em território português a registar este evento.


Egas de Castro assumiu o estudo deste tremor de terra com vista a calcular a profundidade do hipocentro. Este trabalho foi publicado num artigo n’O Instituto, em Novembro de 1909, com o título de Geodynamica tellurica. Não tendo garantido o apoio da Comissão de Estudos Sísmicos, recentemente criada, Egas de Castro recorreu à imprensa para compilar uma relação de 125 localidades (na sua maioria nacionais, mas incluindo algumas espanholas), com as respectivas distâncias a Benavente, distribuídas por graus de força entre IX e IV. Após calcular as respectivas distâncias médias, para cada grau de força (isossista), Egas de Castro obteve como resultados uma profundidade focal de 7,5 km, um coeficiente de absorção de 0,0041 e a intensidade de 9,83º em Benavente, segundo a escala de Cancani. Estudos mais recentes sobre o abalo de 1909 estabeleceram o seu valor de profundidade focal nos 10 km e um máximo de intensidade de IX, na escala modificada de Mercalli.
No ano de 1910, Santos Viegas estabeleceu contactos com Wiechert para adquirir o sismógrafo horizontal, com uma massa inercial de uma tonelada. Devido à turbulência originada pela revolução republicana, verificou-se um atraso na entrega do instrumento, que só teve lugar a 19 de Julho de 1911. Iniciou-se de imediato a construção de um pavilhão para o alojar. Todavia, dificuldades técnicas com a instalação do aparelho, que se prolongariam nos anos seguintes, retardaram a sua montagem, vindo Santos Viegas a falecer, em 1914, em idade avançada, sem ver o sismógrafo em funcionamento. Seria o seu sucessor como director do OMM, Anselmo Ferraz de Carvalho (1878–1955), a concluir, no final de 1914, a instalação do referido sismógrafo
O sismo de Benavente suscitou vários outros trabalhos em Portugal e Espanha. Originou também uma primeira tentativa, que veio a fracassar, de organização de um serviço sismológico em Portugal. Gerou ainda um intercâmbio com geofísicos espanhóis, tendo alguns deles publicado artigos sobre sismologia n’O Instituto. Um exemplo foi o famoso sismólogo espanhol Manuel Maria Sánchez Navarro-Neumann (1867-1941), um padre jesuíta. Em 1915, Navarro-Neumann publicou o seu primeiro artigo n’O Instituto, onde analisou algumas fórmulas aplicáveis a macrossismos, recorrendo a elas em exemplos reais como o sismo de Benavente, com base em alguns resultados do estudo de Egas de Castro. Dois anos depois, a pedido de Francisco Miranda da Costa Lobo (1864-1945), presidente do IC, publicou um outro trabalho na revista do IC, correspondente à conferência que apresentou no 6.º Congresso de Associação Espanhola para o Progresso das Ciências de 1917, realizado em Sevilha. O estudo de Navarro-Neumann incidiu sobre os efeitos dos terramotos nos edifícios, de acordo com as observações recolhidas em diversos sismos, e no funcionamento dos sismógrafos, em especial os existentes no Observatório da Cartuja, e respectiva interpretação de sismogramas.
O ano de 1925, no decorrer do qual o OMM da UC alterou a sua designação para Instituto Geofísico da Universidade de Coimbra (IGUC), foi muito intenso no que respeita à actividade científica em Coimbra. Refira-se a inauguração da secção de astrofísica do Observatório Astronómico e a realização do Congresso Misto das Associações Portuguesa e Espanhola para o Progresso das Ciências. Ferraz de Carvalho, que era também vice-presidente do IC, publicou neste ano n’O Instituto um extenso trabalho sobre sismologia, Estudo actual dos tremores de terra, talvez o primeiro tratado científico sobre este tema publicado em Portugal. Ao mesmo tempo, apresentava uma comunicação no congresso, realizado em Coimbra, das Associações Portuguesa e Espanhola para o Avanço das Ciências, intitulada Colaboração íntima dos serviços sismológicos de Portugal e Espanha.
Apesar da fundação em Coimbra, em 1933, da Sociedade de Meteorologia e Geofísica de Portugal, que tinha Anselmo de Carvalho como presidente honorário, nenhuma das comunicações efectuadas no âmbito desta associação (durante os curtos anos da sua actividade) incidiu especificamente na sismologia. Em 1946, com a criação do Serviço Meteorológico Nacional (SMN), o IGUC foi integrado neste organismo, perdendo a sua autonomia, o que justificou o pedido de exoneração do director Anselmo de Carvalho. Este último havia sucedido, em 1945, como presidente do IC a Costa Lobo. O SMN pouco ou nada trouxe de novo no que respeita à organização da sismologia em território nacional, sendo apenas retomados os estudos macrossísmicos, abandonados de 1930 até 1940.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Congresso Luso-Brasileiro de História das Ciências

O congresso que assinala os "100 anos da criação da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra, que resultou da fusão das Faculdades de Filosofia e Matemática, criadas pela Reforma Pombalina", decorrerá em Coimbra de 26 a 29 de Outubro de 2011.

Para mais informações, consulte aqui a página oficial do Congresso Luso-Brasileiro de História das Ciências.

quinta-feira, 24 de março de 2011

O IC e a Previsão do Tempo na Europa no início do século XX

No final de 1926, foi decidido no IC dar início a um conjunto de conferências sobre a cultura inglesa, ficando prevista uma dedicada à meteorologia em Portugal e a sua relação com a previsão do tempo na região noroeste da Europa. A organização recaiu em Anselmo Ferraz de Carvalho (1878-1955), director do Instituto Geofísico e vice-presidente do IC.

A 8 de Maio de 1927, chegou ao nosso país Jacob Bjerknes (1897–1975) que, segundo a imprensa nacional, era um “ilustre meteorologista norueguês, autor das modernas teorias utilizadas para a previsão do tempo, que veio a Portugal propositadamente para tomar conhecimento directo da meteorologia no nosso país” (Diário de Notícias). Vilhelm Bjerknes tinha fundado em 1917 a Escola de Meteorologia de Bergen, na Noruega, onde com um conjunto de jovens investigadores, entre os quais figurava o seu filho Jacob, se dedicavam à prossecução da investigação com o objectivo de obter modelos de previsão do tempo. Desta escola surgiu um novo modelo dos ciclones extratropicais, cuja origem se explicava através das descontinuidades entre massas de ar contíguas, a temperaturas diferentes, conhecida por teoria da frente polar.

A missão de Jacob Bjerknes em Portugal tinha outro objectivo que tinha ficado estabelecido numa reunião de meteorologistas, realizada em 1926 em Zurique, na Suiça. Nesta reunião, onde também tinha estado presente o oficial meteorologista António de Carvalho Brandão (1878–1937), director dos Serviços Meteorológicos da Marinha criados em 1922, foi anunciada a resolução do governo português de instalar e organizar uma estação de TSF nos Açores. Por conseguinte, foi estabelecida uma comissão incumbida de acompanhar este assunto até à sua resolução final, da qual faziam parte o general Émile Delcambre (1871–1951), director dos serviços meteorológicos franceses, e Bjerknes.

Carvalho Brandão assumia na altura as funções de “Chefe do Serviço Meteorológico Português”, apesar dos serviços de meteorologia de então ainda não se encontrarem, consistentemente, organizados, estando dispersos por várias entidades e observatórios. Numa entrevista a um jornalista do Diário de Notícias, realizada num jantar em casa de Carvalho Brandão em 13 de Maio de 1927, Jacob Bjerknes revelou que uma estação nos Açores viria a solucionar “um problema que preocupa os organismos científicos da Europa, encarregados do estudo e previsão do tempo” devido à lacuna de indicações no Atlântico Setentrional indispensáveis nos cálculos. Este projecto era “tão importante que, provavelmente, se essa estação estivesse em funcionamento não teria a França, nesta ocasião, de lamentar o desaparecimento de Nungesser e Coli”, uma alusão a dois aviadores franceses desaparecidos nesse mesmo mês quando voavam sobre o Atlântico.

Tendo em conta a presença em Portugal de Bjerknes, foi ele o conferencista convidado por Ferraz de Carvalho. Em 23 de Maio, após ter reunido com o governo português, Bjerknes partiu de Lisboa para Coimbra, acompanhado pelo embaixador da Noruega em Lisboa, Finn Koren, e por Carvalho Brandão. Após a sua palestra, no salão nobre do IC, seguiu para Madrid onde se foi encontrar com o director dos serviços meteorológicos espanhóis.

A comunicação de Bjerknes foi publicada n’O Instituto, tendo este sido eleito sócio correspondente da sociedade conimbricense na Assembleia-Geral de 2 de Junho de 1927. Com o título de Les bases scientifiques et techniques de la prévision du temps et le rôle du Portugal à ce rapport, Bjerknes iniciou por ressalvar a importância da previsão do tempo para países marítimos como a Noruega e Portugal, apesar das incertezas destas previsões quando comparadas com as predições astronómicas. Dada a inextricável relação das causas e efeitos em meteorologia com a mobilidade do ar, Bjerknes apresentou uma classificação das correntes de ar e a sua relação, mais simplista, com estados do tempo. As nuvens seriam causadas pelo arrefecimento do ar, processo mais eficaz quando ocorriam correntes ascendentes de ar húmido. O transporte do ar atmosférico processava-se com base em dois tipos de corrente: corrente polar, constituída por ar frio e seco, e corrente tropical, contendo ar mais quente e húmido. O encontro de duas massas de ar, a temperaturas diferentes, originava uma superfície de descontinuidade que iria determinar as condições meteorológicas. Com base na direcção de propagação, seria possível distinguir dois casos: uma frente fria, em que uma cunha de ar frio em deslocamento provoca a ascensão de uma massa de ar quente, e uma frente quente, em que uma massa fria que se encontra em retirada, é perseguida por uma corrente quente que é obrigada a subir.

Apesar da simplicidade aparente, o sucesso da previsão estava, intimamente, dependente do estado inicial, o que exigia conhecer a temperatura, pressão, humidade… de cada ponto da atmosfera, desde o Equador até aos pólos. Para tal, era imprescindível um sistema de estações emissoras de dados atmosféricos, por TSF, espalhadas por todo o globo. Na altura, em Portugal, estavam em funcionamento quatro destas estações: Porto, Coimbra, Lisboa e Faro, estando mais duas, da Berlenga e cabo S. Vicente, prestes a entrarem em funcionamento. Uma vez que as novas condições do tempo se deslocavam, geralmente, de Oeste para Este, as estações dos países ocidentais como a Islândia, Reino Unido e Portugal eram os principais “avant-gardes” da Europa contra as tempestades que se aproximavam da costa Oeste, mas mesmo assim insuficientes.

A resolução do problema estaria na introdução de emissores T.S.F. a bordo dos navios transatlânticos que lhes permitissem transmitir, regularmente, dados meteorológicos ao longo da sua travessia do oceano. Todas estas transmissões deveriam ser recolhidas por estações, estrategicamente, localizadas de forma a cobrir vastas áreas geográficas, que as retransmitiam para os serviços meteorológicos europeus. Evidentemente que as ilhas dos arquipélagos da Madeira e Açores seriam localizações essenciais, considerando mesmo Bjerknes que a estação mais importante seria sempre a dos Açores.

Mais tarde designada de estação meteorológica do Atlântico, a estação açoriana ficou operacional em 1929, uma situação anunciada no Congresso Meteorológico Internacional que teve lugar em Copenhaga nesse ano. O General Delcambre, enquanto se encontrava em Copenhaga, recebeu um telegrama de Paris relatando que a Estação Meteorológica dos Açores tinha enviado um “meteograma” com 81 grupos de 5 algarismos cada, relacionados com as observações realizadas “a bordo dos vapores que sulcavam o Atlântico.” Na Comissão de Serviços Sinópticos do congresso, Delcambre salientou o altíssimo serviço prestado à ciência por Portugal, que classificou como um dos factos mais importantes para o progresso da Meteorologia nos últimos cem anos, acrescentando que marcava o início de uma era nova, pois a estação dos Açores era o fecho da vasta organização internacional, base da navegação aero-transatlântica.

Foi evidente a pressão internacional para o avanço da meteorologia em Portugal, principalmente a partir do momento em que, dado a sua posição geográfica, as observações recolhidas no nosso país e seus arquipélagos se tornaram essenciais para o desenvolvimento do esforço europeu/mundial de previsão do tempo. O anticiclone localizado no Atlântico Norte tem hoje o nome dos Açores, pelo menos na Europa. (excerto de um artigo mais extenso intitulado “The Meteorological Observations in Coimbra and Weather Forecast in Europe”, publicado na edição de Abril de 2011 da revista internacional Earth Sciences History)

O IC e as primeiras Observações Meteorológicas em Coimbra

A partir de Janeiro de 1854 iniciou-se a publicação n’O Instituto das observações meteorológicas levadas a cabo no gabinete de física experimental da Faculdade de Filosofia da Universidade de Coimbra. Estas observações já eram executadas desde o início do século XIX. Nomeadamente, no ano de 1812, Constantino Botelho de Lacerda Lobo (17541820), professor de Física da Faculdade de Filosofia da UC, começou a publicar na revista Jornal de Coimbra as suas observações meteorológicas realizadas ao longo do período de Janeiro de 1812 até Março de 1817. Todavia, estas observações são de reduzido valor científico, uma vez que não foram efectuadas a horas fixas e eram recolhidas no interior do gabinete de Física e não ao ar livre.
Os mapas mensais publicados n’O Instituto continham a temperatura atmosférica, a pressão atmosférica (altura barométrica a 0 ºC, tensão de vapor atmosférico e pressão do ar seco), o estudo higrométrico da atmosfera (grau de humidade e massa de vapor de água por metro cúbico de ar) e o rumo dos ventos, dados medidos ao meio-dia. Os mapas de alguns meses incluíam também o estado do céu e do tempo. O último mapa publicado, relativo ao mês de Janeiro de 1856, da autoria de Matias de Carvalho e Vasconcelos (18321910), na altura lente substituto da cadeira de Física, vem acompanhado de um pequeno texto onde se refere a aquisição por parte do gabinete de física de “uma boa colecção de instrumentos para os trabalhos das observações meteorológicas, e entre estes um excelente anemómetro com os mais recentes aperfeiçoamentos, e o primeiro que neste género aparece entre nós”. No mesmo artigo, exortava-se a necessidade de estabelecer um observatório meteorológico, tendo já assentado o conselho da Faculdade que, não havendo meios para a construção de um edifício próprio, se fizesse uso das instalações do observatório astronómico. As razões apontadas foram que a Faculdade de Filosofia “não podia ficar atrás dos outros estabelecimentos de ciências naturais, nem ser menos solícita em promover aqueles estudos, que são hoje objecto dos assíduos trabalhos dos mais distintos naturalistas, e que em todas as universidades se cultivam com a maior diligência, e aos quais a meteorologia deve os rápidos e assinalados progressos, que ultimamente tem feito noutros países, e mesmo entre nós”.
Verifica-se que entre os professores do gabinete de física era sentida a preocupação de a instituição coimbrã poder ser ultrapassada por outras instituições de ensino superior, em particular pela Escola Politécnica de Lisboa. Logo em 1854, simultaneamente ao início da publicação das observações meteorológicas, António Sanches Goulão (180557), regente da cadeira de Física e então director do gabinete de física, publicou um artigo onde criticou alguns dados dos mapas meteorológicos publicados por José António Dias Pegado. O desacordo situava-se ao nível dos valores de tensão atmosférica, grau de humidade do ar e quantidade de vapor por metro cúbico. Claramente, esta situação sugere a tentativa de afirmação de Coimbra perante a instituição lisboeta.
Na revista d’O Instituto surgem, então, vários artigos dedicados à meteorologia, alguns dos quais de Sanches Goulão. Segundo Goulão, a meteorologia dependia da distribuição de calor à superfície terrestre, pelo que, devido ao grande número de factos e à escassez de leis que os relacionavam, esta parte da física estava ainda longe do grau de perfeição de outras. Goulão fez a descrição do funcionamento dos termómetros líquidos e dos cuidados no seu manuseamento, usando como exemplo o modelo existente no observatório de Paris.
A necessidade de reconhecimento da actividade realizada na Europa, ao nível da meteorologia mas também em outros ramos das ciências físico-naturais, incitou o conselho da Faculdade de Filosofia a enviar alguns dos seus vogais em comissões científicas. Dando cumprimento a este deliberação, em 1857, Matias de Carvalho e Vasconcelos foi encarregado de uma comissão a França e outros países europeus, tendo a missão de contratar um engenheiro, a ser mandado a Coimbra, “para dirigir a construção da estufa e mais obras projectadas no jardim botânico, edificação do observatório meteorológico, e mais obras dos diversos estabelecimentos da Faculdade”. Em 30 de Março de 1858, Matias de Carvalho envia um primeiro relatório, publicado n’O Instituto, onde relatou a sua visita aos observatórios de Greenwich e ao Observatório Real de Bruxelas. Aproveitando a sua presença em Bruxelas, Alphonse Quetelet convidou Matias de Carvalho a participar nos trabalhos de observação do eclipse solar de 15 de Março. As observações magnéticas, durante o eclipse, eram acompanhadas de observações meteorológicas interiores e exteriores de 10 em 10 minutos.
Em 1 de Março de 1860, foi aprovada no conselho da Faculdade de Filosofia uma consulta ao governo para a construção de um observatório meteorológico e magnético. A missiva iniciou-se pela assumpção da importância dos estudos meteorológicos e geofísicos, prosseguidos com rigor em muitas instituições internacionais. Ressalvou-se a insuficiência de resultados que possam ser colhidos com base num “único estabelecimento de meteorologia no litoral”, uma referência ao observatório lisboeta. Reafirmou-se a centralidade da UC, considerando-se que Coimbra era “incontestavelmente o ponto em que melhor assenta, e em que mais economicamente se pode realizar a fundação de um observatório meteorológico, que tal nome mereça na actualidade”. Foi feita referência aos trabalhos do gabinete de física, já publicados n’O Instituto, e às relações firmadas por Matias de Carvalho com observatórios europeus e investigadores internacionais, em particular com Quetelet.
Em 11 de Janeiro de 1861, o conselho da faculdade depositou em Jacinto António de Sousa (181880) o encargo de responsável pela reunião dos meios necessários à fundação do observatório meteorológico. Jacinto de Sousa era professor da cadeira de física e especialista em meteorologia e magnetismo terrestre. Uma das suas primeiras iniciativas foi formular a conveniência de realizar uma viagem ao observatório de Kew, em Inglaterra, de forma a inteirar-se dos instrumentos magnéticos encomendados em Londres. Os relatórios das viagens efectuadas por Jacinto de Sousa foram publicados n’O Instituto em 1861, numa secção à parte da revista designada de secção oficial. A primeira ocorreu de 6 de Junho a 30 de Julho de 1860, integrando a observação do eclipse solar de 18 de Julho em Espanha, no cabo Oropesa, e incluindo os estabelecimentos científicos de Madrid, Paris Bruxelas, Londres, Greenwich e Kew. Em 16 de Agosto do mesmo ano, Jacinto António de Sousa partiu novamente em viagem, esta com o destino único do Observatório de Kew, onde ficou cerca de dois meses. No estudo que levou a cabo neste observatório foi acompanhado pelo director do observatório, Balfour Stewart, e pelo seu assistente Charles Chambers (1834–96).
O primeiro problema que deveria ser resolvido era a localização do novo observatório. Tendo Jacinto Sousa concluído da inexistência de um edifício conveniente a este projecto, optou pela construção de um novo devidamente adequado. A primeira escolha para esta construção seria no local do antigo castelo, onde já se encontrava uma edificação iniciada no século anterior para albergar o observatório astronómico, mas dada a proximidade do local a conventos vizinhos e dados os custos de demolição das muralhas que aí existiam, acabou por levar a rejeição desta alternativa. A selecção recaiu num local conhecido por Cumeada cujas condições circundantes pareciam mais propícias.
Os trabalhos de edificação do novo observatório iniciaram-se em Abril de 1863 e, a partir de 1 de Fevereiro de 1864, começaram a fazer-se observações tri-horárias ao mesmo tempo que a actividade de construção prosseguia. (excerto de um artigo mais extenso intitulado “The Meteorological Observations in Coimbra and Weather Forecast in Europe”, que será publicado em 2011 na revista internacional Earth Sciences History)

quinta-feira, 17 de março de 2011

Resumo da composição da lista de sócios do IC

Ao longo de século e meio de actividade, o Instituto de Coimbra reuniu um total de aproximadamente três mil sócios. O eixo da academia funcionava com base na componente dos efectivos, que somou um número superior a 700. A de correspondentes, porém, era a classe mais numerosa, que atingiu perto de 2000 sócios. Destes, a maior parte era constituída por correspondentes nacionais, embora a quantidade de estrangeiros seja igualmente elevada, mais de oito centenas. A proveniência dos associados estrangeiros distribui-se pela Europa e pela América, ocupando o lugar cimeiro a Espanha, a França e o Brasil. No entanto, o conjunto de países de origem é bastante alargado, do qual podemos enumerar alguns, como a Inglaterra, a Alemanha, a Itália, a Bélgica, os EUA, a Argentina ou o Chile.


Afrânio Peixoto, honorário; Cottinelli Telmo, benemérito; Maria Amália Vaz de Carvalho, honorária

As personalidades de grande mérito que constituem a categoria de sócios honorários atingem um número aproximado de três centenas, com ligeira prevalência dos nacionais sobre os estrangeiros. Quanto aos beneméritos, uma classe que vigorou apenas a partir de 1921, atribuída a indivíduos que contribuíssem com soma importante para os fundos da sociedade, eles foram cerca de dez. Uma nota final para dar conta da presença das mulheres entre os associados do Instituto. Elas começaram a ser eleitas somente em 1896, na presidência de Bernardino Machado, e totalizaram pouco mais de 60.